domingo, janeiro 24, 2010

PostHeaderIcon Dura realidade

Tenho acompanhado uma amiga na busca de casa de repouso para a Mãe dela.
Fomos a uma casa aqui perto de mim e, lá, eu conheci uma senhora de 104 anos que fica o dia inteiro deitada num sofá e de noite é colocada na cama para dormir. Não se movimenta e não tem lucidez. Perdeu o contato com o mundo.
Conheci outra, de 86 anos que fala mais do que a boca. Feia, muito feia, mas completa e totalmente lucida. Diz que foi para lá por que quebrou o fêmur e teve complicações e que sairá de lá em 2 meses. Contou que tem 5 livros publicados entre contos e romances e que advogou muito.
Outra, de 95 anos está lúcida. Também sofreu com a cirurgia do fêmur. Depois, outras complicações surgiram. Disse que gosta da casa e que as moças são muito atenciosas e carinhosas. Conversei com ela longe das moças e da administradora.
Consegui me chocar ao ouvir, insistentemente, uma idosa chamar pela "moça" para que desse comida e ela havia acabado de ser alimentada e não se lembrava.
Vi muitos mais idosos com problemas diversos e alguns deles em companhia de familiares, mas não gostei do local. Senti-me estranha lá dentro, embora ambiente limpo e medianamente arrumado e muito calor humano. Poderia ter mão feminina para deixar tudo mais bonito e sem gastos.
Na outra casa que fui com minha amiga a situação era diferente, pois, toda branca, camas hospitalares, enfermagem e ajudantes circulando, jardim interno e frieza doentia. Faltou calor humano.
Conversei com as pessoas da equipe mas a frieza me incomodou muito. Vi internos com cuidadoras pessoais e me perguntei para que estar numa clínica, mas ...
Nessa clinica eu conheci uma senhora com pouco mais de 60 anos em estado de debilidade física total. Ela tem uma doença que vai paralizando os músculos e depois não consegue nem respirar sem ajuda. O cérebro é preservado. Ela sofre porque sempre foi pesquisadora e lecionou em grandes faculdades pelo Brasil.
Numa terceira clínica em que estive com minha amiga o que mais me chocou foi a mentira. Ela avisou que iria visitar a casa. Quando chegamos nos deparamos com três idosas muito arrumadinhas conversando entre si. Uma delas aos 99 anos lúcida e alegre; outra de 87 surda e outra de uns 90 anos com agulhas de tricô na mão fazendo um sapatinho. A turma se animou com a chegada de uma senhora de uns 70 anos que visitava a de 99, com sacolinha cheia de frutas. O papo foi engrossando e era alegria incontida. Outras idosas chegaram e o grupinho cresceu.
No dia seguinte todas tinham desaparecido e a loucura tomara conta da casa. Pessoas muito debilitadas e desligadas da realidade andando sós pela casa, aos gritos; pratos, copos e talheres de plástico distribuidos aos internos ... Os móveis são vagabundos demais.
Essa clinica tem 3 unidades e conheci 2 delas. A segunda que visitei tem aspecto simpático, mas é um labirinto e tem acomodações feias e móveis de baixa qualidade. Nessa casa eu vi muitos idosos sentados na sala olhando para o nada, esperando o tempo passar. Acabou o interesse pela vida e pelas coisas. Acredito que se houvesse terapeuta ocupacional eles não se interessariam em participar das sessões. Não conversam entre si.
Os olhos estão fracos; as mãos tremem, a atenção intermitente e não dá para fazer trabalhos manuais, não dá para ler e os assuntos acabaram. Televisão é horrível, pois, muitos estão surdos e enxergam mal.
Numa clínica o banheiro é adaptado com o vaso sanitário alto e com suportes nas paredes. Noutra, os vasos são no chão e a direção entende que os idosos não precisam dos vasos altos porque são baixinhos... Assentos especiais são proibidos ou desconhecidos, depende de quem lhe responde.
Banheiro no corredor é a tônica. Idoso não precisa de privacidade!
O que a idade faz com as pessoas me incomoda muitissimo. Essa perda gradativa das forças e das capacidades me entristece e preocupa.
A qualidade dessas clínicas está me deixando arrepiada, especialmente porque sou só, sem filhos.

Elza

14 comentários:

Sonia H disse...

Elza querida,
Imagino como você não esteja se sentindo depois dessas experiências. Eu fiquei arrasada com esse post. Eu já sabia que era mais ou menos do jeito que você narrou, mas nunca vivenciei algo assim.
Sabe, Elza, este é um assunto que me toca profundamente por que considero a pessoa idosa muito preciosa em qualquer família. Era assim no Brasil (pois creio que o velho tem sido muito renegado em nosso pais nos últimos tempos...). O velho é valorizado na Índia, na China, no Japão e em tantos outros países.
O Brasil está envelhecendo e pelo menos, entre meus conhecidos, vejo a dificuldade que é cuidar do idoso, desde os remédios a internações e uma assistência completa e justa.
O que mais me assusta é a solidão. Como na descrição que você fez, com relação às pessoas lúcidas que estão em 'lares' como estes e se sentem totalmente desimportantes... Sinto-me triste e se fizer algum trabalho voluntário, farei com essas pessoas, pois me comove esta situação. Espero não passar por isso um dia. Morro de medo de perder a minha lucidez, Elzinha.
Excelente post para reflexão.
Beijos,

Rosamaria disse...

Elzinha, assino embaixo do que a Sonia falou, inclusive o medo de perder a lucidez.
Ajudei a cuidar da minha mãe e conforme ia lendo teu post ia lembrando dela que, graças a Deus, nós demos tudo o que podíamos, não só material, mas com a nossa presença e carinho.
Te cuida, guria, que tu podes, agora, chegar a uma idade avançada com qualidade de vida.
Bjim.

Milton T disse...

Tenho as mesmas preocupações Elza, pois mamãe mora comigo, tem 76, mas aparenta 60. Exames médicos em ordem, mas também não tenho filhos e não imagino um ente querido num lugar desses.
Casa e repouso bacana só em novelas e na tv. Espero que suA amiga consiga resolver a situação
boa semana
bjs

J.F. disse...

Elza, um post muito triste mas de uma realidade impressionante. A Nina e eu tomamos conta de meu pai, de 94 anos, muito debilitado mas totalmente lúcido e absolutamente carente de nossas presenças. Fazemos tudo que nos é possível para que ele tenha as melhores condições possíveis. Deus nos livre de precisar enviá-lo a uma instituição qualquer. Seria o fim dele e, acho, nosso também (de remorsos!). Se cuida, minha amiga.
Abração.

Celia disse...

Elzinha, posso imaginar como vc se sente depois da visita a essas casas de idosos. Deprimente mesmo, ver pessoas que eram ativas, de repente ficarem assim, vivendo num ambiente desse que nada ajudam pra faze-las felizes.
A experiencia que tenho, é daqui. Minha sogra viveu numa casa de idosos, onde eles faziam muitas atividades, saiam, jogavam, bebiam, tinham jantares de festa lá mesmo, mas eu a sentia triste as vezes. Nao é mesmo fácil se sentir uma pessoa sem poder fazer nada, quando um dia foram pessoas super ativas, como ela foi.

Blog do Beagle disse...

Sonia, pelo que entendi nessa minha visitação aos lares é que o velho se isola e se desinteressa pelas coisas da vida. Quando menos ouve e quanto menos vê, mais alheio fica. Nem precisa desenvolver qualquer doença, mas fica senil. A velhice me incomoda, essa é a verdade. Todos os idosos que vi estavam bem vestidos, bem assistidos e bem tratados, pois, internados em clínicas particulares e nem tão caras como podem parecer.
Senti que eles só deicxaram suas casas por que precisam de cuidadores e manter essa turma de 4pessoas é muito mais caro do que a mensalidade do lar.
Caso eu perca a lucidez ou meus movimentos irei apra uma casa dessas pois, não tenho quem me cuide e isso me choca!
Bjsssssssss querida. Elza

Blog do Beagle disse...

Rosinha, minha Mãe se foi com 82 anos. Estava lucida, mas não andava por causa do tal do fêmur... Não me ocorreu interna-la por que ela comandava sua vida da cama. Passava a mão no telefone e resolvia tudo que precisava, desde pedir carne no açougue como chamar o gerente do banco às falas. A irmã mais velha de minha Mãe está com 94 anos e completamente lúcida, embora surdinha. Mora com a filha e está bem.
Do meu ponto de vista leigo e de quem visitou esses lares a dificuldade está na perda da capacidade de gerir sua vida e aí, um lar é a única solução.
Bjkª. Elza

Blog do Beagle disse...

Milton, existem casas muito boas e tratamento de primeira linha, mas são carissimas. O problema de deixar um ente querido internado é a sensação de te-lo abandonado e enterrado vivo, mas isso s[ó acontece se a familia o largar lá. A familia pode e deve visitar seu idoso várias vezes por semana e lervar roupas e frutas, chocolates e carinho. O idoso estará bem tratado, com enfermeiros e cuidadores especializados todo o tempo. O que me choca e espanta é a inercia e o desinteresse pela vida. Sua Mãe é nova, ainda. Cheia de vida e de atitudes, vai onde quer, tem plena capacidade intelectual e física. Fique bem. Bj. Elza

Blog do Beagle disse...

J.F. vocês tem meios de manter o Pai junto de vocês e é maravilhoso saber disso. Dureza é quando não é mais possível essa relação. Dureza é ter que trabalhar e deixar o idoso nas mãos de cuidadores que nem sempre cuidam... Internar é dificil, mas uma boa solução. Bj. Elza

Blog do Beagle disse...

Celia, vc captou a mensagem e entendeu o meu medo. Numa dessas casas eu conheci uma senhora de 85 anos que lê, sai para a rua sozinha, vai à Igreja para missa e também apra participar de reuniões com outras paroquianas. Ela vai a restaurantes e presta serviço voluntário. Mora no lar e tem sua vida pessoal rica e interessante. No dia em que a conheci estava maquiada e pronta para mais uma atividade fora da casa. Pena que poucos idosos permaneçam com suas funções intactas. Bjs. Elza

Magui disse...

A velhice é terrível, corroe tudo, vira humilhação mesmo.Para tentar não ficar assim é que cuido da minha alimentação e faço academia mas o futuro ninguém sabe. Não viu a Hebe? Envelheceu de um dia pra outro.

Blog do Beagle disse...

Magui, ando assustada. No outro blog eu postei sobre a morte. Não estou deprimida, não. A realidade está aqui do meu lado e eu, boa observadora, internalizei. Muitas idosas pertinho de mim e algumas com restrições físicas, mas lúcidas. Outras, com restrições mentais e lépidas ... Como eu ficarei? Bjssssssss Elza

Marilda Siqueira disse...

Nesta semana tive que internar meu Pai numa Casa de Repouso; não consegui cuidar dele pq ele está com Alzheimer, seu quadro se agravou pq se tornou muito agressivo.
Fiquei com medo que na sua loucura por causa da doença, agredisse a mim ou a minha família, assim como fez em outras vezes.
Mas foi uma decissão muito dificil, estou muito triste e choro muito.
Sinto que fracassei, peço a Deus coragem e força.

Blog do Beagle disse...

Marilda, não sei pq vc se sente fracassada. Vc foi muito corajosa, isso sim. Penso assim: impossível manter o parente em casa por alguma circunstância, como a sua, de demencia e agressividade? Interne numa clínica, pois, o ente querido perdeu o bonde da história e não sabe onde está.
O que me entristeceu foi observar pessoas capazes jogadas nesses casas e muito mal cuidadas.
Acalme seu coração e viva a vida e dê ao seu Pai todas as condições de sobrevida sem ofender aos seus. Bj carinhoso. Elza

Thelma Louise

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Elza Maria sempre em busca de respostas. Paradoxal, curiosa, inteligente, crítica, observadora, sentimental, habilidosa, amorosa, sensível, disciplinada e um montão de outras coisas. Ser humano normal, comum, mediano, mas que gosta de escrever e está no quarto blog.

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